P. ANTÓNIO VIEIRA: "No príncipio do mundo, como gravemente pondera Séneca, porque não havia guerras? Porque usavam os homens da tera como do céu? O sol, a lua, as estrelas, e o uso da luz é comun a todos, e assim era a terra no pricípio. Porém, depois que a terra se devidiu em diferentes senhores, logo houve guerras e batalhas, e se acabou a paz, porque houve meu e teu. Que direi dos meios e dos remédios das indústrias, das artes e dos instrumentos, que os homens têm inventado, para que cada um pudesse possuir e lograr o seu, segura e quietamente, mas sem proveito? Para guardar a casa inventaram as portas e as fechaduras; mas, pela mesma abertura por onde entra a chave, deixa também aberta a entrada para a gazua.
"Para assinalar os limites de cada um inventaram os marcos, e para guardar a vinha e o pomar os valados, as silvas, as sebes e as paredes de pedra ligada ou solta; mas tudo isso se rompe e se escala. Para guardar as cidades inventaram os muros, os fossos, as torres, os baluartes, os presídios, a artilharia, a póvora; mas não há cidade tão forte, que por bateria ou assalto, ou minada por baixo da terra ou pelo, ar, se não expugne e renda.
"Para guardar os reinos e os impérios, inventaram as armadas por mar, e os exércitos por terra, tantos mil soldados a pé, tantos mil a cavalo, com tanta ordem e disciplina, com tanta variedade de armas, com tantos artifícios e máquinas bélicas, nenhum destes aparatos tão estrondosos e formidáveis têm bastado, nem para que os assírios guardassem o seu império dos persas, nem os persas o seu dos gregos, nem os gregos o seu dos romanos, nem os romanos finalmente o seu daqueles a quem o tinham tomado, tornando a ser vencido dos mesmos que tinham vencido e dominado."
Postado por Daniel Costa